Narrativa sobre a Igreja Católica e o Nazismo

Narrar os eventos que relacionam a Igreja Católica com o nazismo nos faz entrar, no tempo presente, em uma área cinzenta e turva que transita de um período escuro de difamações para a claridade da verdade. Ao final da leitura deste Artigo, o leitor estará apto a concluir que a Igreja Católica não apoiou, mas sim condenou o nazismo, que a Igreja Católica foi perseguida e brutalizada pelo nazismo, que a Igreja Católica enfrentou o nazismo, que a Igreja Católica protegeu os judeus, que a Igreja Católica foi massacrada e teve sobre si pairando a ameaça constante da devastação total. Também estará apto a concluir que a Igreja e o Papa da época saíram da Igreja com um saldo muito positivo e muito elogiado relacionado à contribuição prestada à humanidade. E que essa memória positiva logo foi maculada por uma rede de propaganda dedicada a denegrir, difamar, caluniar e construir uma lenda negra incompatível com a verdade dos fatos.
Os argumentos usados são frágeis, inconsistentes ou mentirosos. Os mais bem trabalhados alegam que o Papa Pio XII seria o "Papa de Hitler" tendo se omitido de condenar o Führer em um grande ato público midiático dedicado a atacar a reputação da Alemanha Nazista. Tampouco se recusou a cortar relações com a Alemanha Nazista ou abrir mão da linguagem diplomática escolhida para comunicar suas posições oficiais. Segundo os críticos, isso teria sido de vital importância para abortar o avanço da Alemanha Nazista. E decidindo-se pelo não-fazer, a Igreja teria colaborado diretamente com o projeto do III Reich.
Essa narrativa que olha para o passado afim julgá-lo, como um engenheiro de obra pronta, ignora algumas questões muito importantes que não podem ser esquecidas neste tema. Vamos conhecê-los.
Primeiro temos que lembrar e ter em consideração que a Igreja Católica é uma instituição com uma estrutura multinacional e composta por centenas de milhões de fiéis espalhados por todo mundo. Diante de um quadro de perseguição, o Pastor dessa Instituição precisa agir com muita cautela e prudência, pois uma palavra fora do lugar pode levar à destruição dos católicos que vivem sob determinados regimes. Imagine só se o Papa Reinante da época presente decidir atacar Kin Jon-Un com todos os termos negativos que ele merece. O Papa nada sofrerá, pois está longe da zona de influência desse ditador, porém ele provavelmente vai reagir perseguindo e brutalizando ainda mais qualquer eventual católico que encontrar. Comparando, é como pensar na linguagem polida e até implorativa que o pai desesperado usa ao falar ao telefone com o sequestrador que faz sua filha de refém e ameaça sua vida e integridade. No caso de Hitler, pôr a destruição da Igreja Católica como prioridade no checklist nazista teria como consequência que Hitler, sem muito esforço, massacrasse - ainda mais - todos os católicos sob a bota de seu poder. Para ele, que chegou a ocupar a Itália, percorrer dois conjuntos de montanhas e arrasar todo o Vaticano custaria materialmente muito pouco. Entender isso é simples para qualquer um que tenha boa vontade.
Depois, no decurso de um cenário de caos generalizado, a prioridade da Igreja não é sentenciar culpados e canonizar inocentes, mas sim trabalhar para que a violência seja interrompida o mais rápido possível, numa lógica de contenção de danos. Para isso, precisa adquirir uma postura minimamente imparcial, de tal modo o diálogo com ambas as partes conflitantes não se torna uma total impossibilidade.
Era consenso na época que estardalhaços midiáticos por parte da Igreja só trariam desgraça e ruína para as vítimas potenciais de Hitler, que frise-se incluía não apenas judeus, mas também católicos leigos, religiosos e sacerdotes.
Em junho/1942, declarava o Núncio Papal da Romênia, o Arcebispo Andrea Cassulo: "Devo proceder com cautela porque [as minhas ações] poderiam arruinar, em vez de serem úteis, tantas pessoas miseráveis a quem devo frequentemente ouvir e ajudar." (Angelo Martini, S.J., "La Santa Sede e gli ebreidella Romania durante la seconda guerra mondiale" (reprint), Civilta Cattolica, 1951, III (2669), p. 459)
Em Agosto de 1942, uma Carta Papal para ser lida em todas as Igrejas da Polônia foi entregue a Adam Sapieha, Arcebispo de Cracóvia, a Carta continha uma declaração de solidariedade e um repúdio ao nazismo. Mons. Sapieha porém lamentou e recusou-se a obedecer à instrução do Papa: "Pelo amor de Deus, é impossível para mim encaminhar essa Carta aos meus sacerdotes, muito menos posso lê-la em voz alta. Se apenas uma cópia dessa Carta chegar às mãos da SS, todas as nossas cabeças irão rolar." Mons. Sapieha mandou queimar a Carta e respondeu ao Papa Pio XII: "Me atormenta profundamente não poder transmitir a Carta de Vossa Santidade aos nossos fiéis, mas isso serviria de pretexto para novas perseguições."
A Igreja Católica holandesa foi menos cautelosa e pagou um preço alto por isso. Em jul/1942, uma Carta Pastoral inspirada pelo Papa e assinada pelos Bispos holandeses foi lida no púlpito de todas as paróquias holandesa. Ao longo da semana seguinte, os nazistas retaliaram enviando 40.000 judeus para Auschwitz, incluindo os judeus convertidos ao catolicismo: sacerdotes, fiéis leigos e religiosos, como Santa Teresa Benedita da Cruz. O Arcebispo de Utrecht lamentou sua insensatez: "Se eu tivesse permanecido em silêncio e não protestado, todos estes judeus católicos ainda estariam vivos."
Em 02 de junho de 1943, o Papa Pio XII escrevia esta advertência aos Sagrado Colégio dos Cardeais, dando a eles o princípio de proceder recomendado: "Cada palavra que dirigimos às autoridades responsáveis e cada uma das nossas declarações públicas deviam ser seriamente pesadas e consideradas no interesse dos próprios perseguidos, para não tornar a sua situação involuntariamente ainda mais difícil e insuportável." (Sir Alec Randall. The Pope, the Jews, and the Nazis" (pamphlet), London, Catholic Truth Society, 1963, p. 18. Também em: Peter White, An Attack on Pope Pius XII, Jubilee, June, 1963)
Não apenas o Papa procedeu conforme a sensatez. Ernst von Weizsacker, o embaixador alemão no Vaticano, durante a Segunda Guerra Mundial, escreveu em suas Memórias: "Nem mesmo instituições de importância mundial, como a Cruz Vermelha Internacional ou a Igreja Católica Romana, consideraram adequado apelar a Hitler de uma forma geral em nome dos Judeus ou apelar abertamente às simpatias do mundo. Foi precisamente porque queriam ajudar os judeus que estas organizações se abstiveram de fazer qualquer apelo geral e público, pois eles estavam com medo de ferir, em vez de ajudar, os judeus." (Peter White, An Attack on Pope Pius XII, Jubilee, June, 1963. Também em: Paul Duclos, Le Vatican et la seconde guerre mondial, Paris, Pedone,1955, pp. 221-223)
Corroborando a concretude dessas ameaças, sobre uma eventual declaração pública do Vaticano sobre o tema, Joachim von Ribbentrop (Secretário de Relações Exteriores da Alemanha) telegrafou para Ernst von Weizsacker para advertir o seguinte: "Se o Vaticano se opusesse política ou propagandisticamente à Alemanha, deveria ficar inequivocamente claro que o agravamento das relações entre a Alemanha e o Vaticano não teria de forma alguma um efeito adverso apenas na Alemanha. Pelo contrário, o governo alemão teria à sua disposição material de propaganda eficaz suficiente, bem como medidas de retaliação, para neutralizar cada tentativa de movimento do Vaticano." (Dr. Robert M. W. Kempner in Frankfurter Allgemeine Zeitung, May 23, 1963)
A seriedade dessa ameaça era perceptível não apenas para o Vaticano, mas também para muitos judeus. Por exemplo, um casal de judeus, o Sr. e a Srª Wolfsson, conseguiram chegar a Roma após terem estado num Campo de Concentração. Em Roma, refugiaram-se num Convento de freiras alemães, enquanto Pio XII providenciou sua fuga para a Espanha. Sobre isso, disseram: "Nenhum de nós queria que o Papa tomasse uma posição aberta. Éramos todos fugitivos, e os fugitivos não querem ser apontados. A Gestapo teria ficado mais entusiasmada e intensificado as suas inquisições. Se o Papa tivesse protestado, Roma teria se tornado o centro das atenções. Era melhor que o Papa não dissesse nada. Todos partilhávamos esta opinião na altura e esta é ainda hoje a nossa convicção." (Angelo Martini, S.J., "Il Vacario: Unatragedia cristiana?" (reprint) Civilta Cattolica,1963, II (2710), p. 317)
Em uma Carta publicada no Londom Times em 15/05/1963, Sir Alec Randall, ex-representante britânico no Vaticano, comentou: "Outros, além de Pio XII, tiveram de enfrentar um dilema angustiante semelhante. O cardeal polaco, Príncipe Sapieha, implorou a Pio XII que não fizesse protestos públicos, pois apenas aumentavam a perseguição ao seu povo. A Cruz Vermelha Internacional absteve-se de protestar porque temia que o seu trabalho nos países controlados pela Alemanha fosse interrompido. Os governos britânico e americano foram acusados de indiferença insensível ao destino dos judeus porque não conseguiram tirá-los das garras nazi antes que fosse tarde demais. Ter feito o que lhes foi pedido teria prolongado a guerra."
"Pio XII escolheu a política do silêncio para salvar vidas. O papa ordenou a abertura das igrejas, escolas, conventos e universidades de Roma para esconder os judeus romanos [que viviam em Roma]. … ele permaneceu em silêncio, porque estava muito bem informado do que estava acontecendo na Europa ocupada." O silêncio, assim, foi a alternativa que sobrou para que o confronto com Hitler não desencadeasse sua fúria, que desaguaria numa repressão ainda maior sobre judeus e católicos. E permitindo, ainda, que uma operação humanitária passasse relativamente despercebida. Mons. Ortí descreve o enviou de Núncios, Bispos, Padres e Freiras nos países do mundo para operar a rede de resgate de judeus. Comentando o grande número de judeus que foram salvos graças a essas contribuições, ele reitera: "Estas coisas foram feitas porque o papa deu ordens específicas para fazer todo o possível para salvar judeus." (Pío XII (1939-1958): El Papa, Defensor Y Salvador De Los Judios) Andrés Martínez Esteban, professor de História da Igreja da Universidade de San Damaso, na Espanha, em Entrevista à BBC, 2023: "Nos arquivos do Vaticano há evidências que comprovam que quando Roma foi invadida (em 1943) pelo Exército nazista, foi pedido à comunidade judaica que entregasse uma certa quantidade de ouro, e o papa deu ordem às paróquias romanas para darem todo o ouro que tivessem e assim ajudarem os judeus a fazer o pagamento. [Há documentos que comprovam que Hitler planejou invadir o Vaticano e levar Pio XII aprisionado para Alemanha, tal qual Napoleão fizera com Pio IX.]" E, ainda: "Quando os bispos holandeses publicaram uma carta em 1942 condenando a perseguição nazista aos judeus na Holanda invadida, o Exército alemão assaltou as igrejas e conventos, e Edith Stein [freira de origem judaíca - conhecida como Santa Teresa Benedita da Cruz - convertida ao catolicismo e morta no campo de concentração de Auschwitz] foi detida lá. … [era inviável enfrentar Hitler com uma retórica pesada, em virtude das graves ameaças à Igreja no mundo todo, especialmente nos territórios invadidos] Não esqueçamos que Roma foi invadida pelos nazistas."
Até aqui, basicamente falamos basicamente do que a Igreja não fez. Falaremos agora do enfrentamento mais direto entre Igreja e Nacional-Socialismo:
Já em 12/05/1917, Mons. Pacelli (então secretário de Assuntos Extraordinários) reuniu-se com o presidente da Organização Sionista Mundial, Nahum Sokolow, e mediou uma audiência dele com o Papa Bento XV, para discutir a criação de uma pátria judaica. O judeu mostrou-se animado com o resultado da Audiência. Em 15 de novembro de 1917, o Núncio Pacelli atendeu ao pedido urgente da comunidade judaica da Suíça para a sua intervenção, porque temia um massacre dos judeus na Palestina pelo Império Otomano. Pacelli pediu ao governo alemão, que se aliou aos turcos otomanos, que protegesse os judeus da Palestina, “mesmo com o uso de armas” e teve sucesso no requerimento. Em 15 de fevereiro de 1925, voltou a mediar o encontro de Sokolow com Cardeal Pietro Gasparri, sobre o tema de uma pátria judaica na Palestina. Em 1926, Mons. Pacelli lançou um apelo a todos os católicos para que se juntassem ao movimento pró-Palestina na Alemanha. O movimento contava com membros como Albert Einstein, Thomas Mann, Konrad Adenauer e Pe. Ludwig Kaas.
À época próxima da ascensão do nazismo, servia como Núncio Papal em solo alemão o Cardeal Eugenio Pacelli (futuro Papa Pio XII). O diplomata e historiador israelense Pinches Lapide observou que, quarenta dos quarenta e quatro discursos que o Card. Pacelli proferiu entre 1917 e 1929 (quando atuava como Núncio Papal na Baviera e em solo alemão) continham ataques ao Nazismo ou as suas doutrinas. Em 1929, foi eleito Secretário de Estado do Papa Pio XI.
Em setembro de 1930, a Arquidiocese de Mogúncia condenou publicamente o Partido Nazista. A condenação mencionava "o nacional-socialismo possui notória incompatibilidade com a fé católica" e que estava: "proibido a qualquer católico inscrever-se nas fileiras do Partido Nacional-Socialista de Hitler. ... Aos membros do Partido Hitleriano não se permite participar de funerais ou de outras celebrações católicas similares. ... Ao católico inscrito no partido hitleriano, não se admite aos sacramentos." A condenação da Arquidiocese de Mogúncia foi publicada em primeira página pelo L'Osservatore Romano (Jornal Oficial da Santa Sé), em um artigo de 11 de outubro de 1930, sob o título: "Partido de Hitler condenado pela autoridade eclesiástica".
Em fevereiro de 1931, a Diocese de Munique confirmou a incompatibilidade da fé católica com o Partido Nazista. Em março de 1931, as Dioceses de Colônia, Parderborn e as Províncias de Renânia também publicaram documentos condenatórios, proibindo os referidos contatos - acima mencionados - entre católicos e nazistas. Indignados e furiosos pela excomunhão, os nazistas enviaram Hermann Göring a Roma, com Petição de Audiência com o Secretário de Estado Eugenio Pacelli. O Card. Pacelli recusou-se a receber Göring e enviou o Subsecretário, D. Giuseppe Pizzardo, que anotou todas as reivindicações dos nazistas.
No mesmo ano, o Card. Michael von Faulhhaber escreveu: "[os] bispos, como guardiões dos verdadeiros ensinamentos de fé e moral, devem emitir um aviso sobre a Socialismo, desde que e na medida em que mantenha pontos de vista político-culturais que não sejam conciliáveis com a doutrina católica.” O Card. Adolf Bertram seguiu na esteira e convocou os católicos alemães a se oporem ao nacional-socialismo em sua totalidade porque "está na mais aguda contradição com as verdades fundamentais do cristianismo". (Krieg, Robert (27 February 2004). Catholic Theologians in Nazi Germany. Bloomsbury Academic. pp. 2–3 e Smolinsky, Heribert (1998). "Nationalsozialismus: Romischkatholische Kirche". Lexikon für Theologie und Kirche (in German))
Em agosto de 1932, a Igreja excomungou todos os dirigentes do Partido Nazista, mencionando explicitamente as teorias étnicas e o racismo. No mesmo mês, a Conferência Episcopal Alemã publicou um documento detalhado no qual eram dadas instruções aos católicos de como se relacionar com o Partido Nacional-Socialista. Nele estava escrito a unanimidade: "Todos os Ordinários declararam ilícito pertencer ao Partido Nazista ... [porque as manifestações de numerosos chefes e publicitários do Partido têm um caráter hostil à fé ... [e] são hostis às doutrinas fundamentais e às indicações da Igreja Católica". Além disso, informava que a desobediência implicaria em excomunhão latae sententiae.
Em janeiro de 1933, com a ascensão de Hitler, as associações católicas alemães difundiram um folheto intitulado: "Um convite sério em um momento grave". Nele estava escrito que a vitória do Partido Nacional Socialista era um "desastre" para o povo e para a nação.
No dia 10 de março de 1933, a Conferência Episcopal Alemã, reunida em Fulda, enviou um apelo ao Presidente da Alemanha, o General Paul L. von Beneckendorff und von Hindenburg, expressando "nossas preocupações mais graves, que são compartilhadas por amplos setores da população." Nelas, expressavam o temor de que os nazistas não iriam respeitar "o santuário da Igreja e a posição da Igreja na vida pública." Por isso solicitaram ao Presidente uma "urgente proteção da Igreja e da vida eclesiástica." No mesmo ano, a Alemanha Nazista e a Santa Sé assinarão uma concordata (Reichskonkordat) em que Hitler compromete-se a respeitar a autonomia da Igreja Católica. A concordata foi o mais sensato a se fazer frente a uma escalada dos nacional-socialistas para garantir algum capacidade de resistência institucional à Igreja junto ao Estado anticatólico. O Card. de Munique, Michael von Fauhaber, comentou dizendo: "Com a Concordata somos enforcados. Sem a Concordata, somos enforcados, arrastados e esquartejados." Já o Card. Pacelli declarou ao Embaixador Britânico: "Tive que escolher entre um Acordo ou a virtual eliminação da Igreja Católica do Reich." E disse ainda que sentiu como se estivesse negociando "com o próprio Diabo." Porém von Hindenburg morreu em agosto de 1934 e Hitler escalou rumo ao totalitarismo, primeiro com a jurisdição como Führer da Alemanha, depois com o Programa de Gleichschaltung. O tratado seria violado pelos nazistas rotineiramente.
Em seus três sermões do Advento de 1933, o Card.Michael von Faulhaber afirmou as origens judaicas de Jesus e da Bíblia. Faulhaber é considerado um dos primeiros críticos públicos do nazismo. O bispo de Münster Clemens August Graf von Galen era primo de Preysing. Em um sermão de janeiro de 1934, condenou a política racial nazista. Galen equiparou a lealdade inquestionável ao Reich com "escravidão" e se opôs à teoria de Hitler sobre a pureza alemã.
Nos anos seguintes, os nazistas vão restringir as atividades da Igreja, expropriar mosteiros, conventos e propriedades da Igreja. Em Abril de 1935, o Card. Pacelli discursou diante de uma multidão de duzentos e cinquenta mil peregrinos condenando os nazistas. Disse ele: "São, na realidade, apenas miseráveis plagiadores que vestem velhos erros com enfeites novos. Não faz qualquer diferença se eles se aglomeram nas bandeiras da revolução social, se são guiados por um falso conceito do mundo e da vida, ou se são possuídos pela superstição de um culto racial de sangue." O discurso repercutiu mundialmente. Tais declarações, acrescidos ao seu histórico e a numeráveis outros comentários privados que vazavam e repercutiam valeram ao Papa Pio XII o inimigo nº 1 dos nazistas.
Em 14 de março de 1937, o Papa Pio XI publicou sua Encíclica Mit brennender Sorge ("Com Ardente Preocupação"), na qual condena o nacional-Socialismo e sua ideologia racista e racialista. A Encíclica foi publicada dias antes da Encíclica Divini Redemptoris, em que o mesmo Papa condena o comunismo. Mit brennender Sorge é considerado o primeiro documento público de um chefe de Estado europeu a condenar o nazismo. A Encíclica trás um ataque direto a Hitler, sem citá-lo nominalmente: "Aquele que, com sacrílego desconhecimento das diferenças essenciais entre Deus e a critura, entre o Homem-Deus e o simples homem, ousar colocar-se ao nível de Cristo, ou pior ainda, acima d'Ele ou contra Ele, um simples mortal, ainda que fosse o maior de todos os tempos, saiba que é um profeta de fantasias a quem se aplica espontaneamente a palavra da Escritura: 'Aquele que mora nos céus zomba deles' (Sl. 2,4)". Esse foi a primeira Encíclica da história da Igreja escrita em alemão. Ajudaram a redigi-la como ghost-writers o Card. Eugenio Pacelli e os bispos Clemens August Graf von Galen e Presying. Concluída a redação, cópias da Encíclica foram enviadas clandestinamente à Alemanha e reproduzidas por oficiais gráficos da Igreja Católica e distribuídas aos bispos, padres e capelães, com ordens de que fossem lidas em todas as paróquias após a homilia matutina do dia 21 de março de 1937, festa de Domingo de Ramos, quando a presença dos fiéis e autoridades na Missa costuma ser máxima. A retórica usada pelo Papa Pio XI nesta Encíclica é de uma agressividade raramente vista em documentos papais.
A resposta de Hitler à Igreja foi duríssima, com milhares de religiosos, padres e bispos, líderes leigos influentes como jornalistas e políticos, sendo presos. Muitos foram enviados para campos de concentração onde vários perderam a vida. Até escolas católicas foram fechadas e cemitérios católicos profanados. As Ordens religiosas foram alvo especial dos nazistas.
Em 13/04/1938, a Congregação para os Seminários e Universidades enviou uma Carta Circular a todos os Bispos, Reitores ou Superiores dos institutos católicos requerendo dos professores que, apoiando-se na força da filosofia, biologia, história e apologética, refutassem as teses que se difundiam. Cinco das oito diziam respeito à doutrina racial de Hitler. A Circular foi republicada em italiano em vários jornais diocesanos com comentários dos próprios bispos ou clérigos que estavam de pleno acordo com as diretrizes de Pio XI. O regime fascista respondeu censurando os boletins noticiosos diocesanos, que em alguns casos contou com o protesto de Bispos locais. Foi o caso do Bispo Carlo Agostini e do Bispo Giacinto Tredici, que escreveu ao Card. Pacelli em 19/08/1938, do Bispo Agostino Addeo e do Bispo Giovanni Cazzani de Farinacci, que escreveu em 08/08/1938: "Estas palavras derivam e derivam seu significado da cultura exagerada, pagã, anti-cristã e anti-romana do racismo. … que é professada e posta em prática nas medidas legislativas na Alemanha de Hitler." (ASV, AES, Italia, Pos. 1054 P.O., fasc. 730, ff. 10-28; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008).
Em 21/07/1938, o Papa declarou em Audiência para 150 Assistentes Eclesiásticos da Ação Católica Italiana que "Católico significa universal, não racista, nacionalista, separatista. Essas ideologias não são cristãs, mas acabam nem sendo humanas. … Infelizmente há algo que é muito pior do que uma ou outra fórmula de racismo e nacionalismo, que é o espírito que os dita." (FATTORINI, Emma. Pio XI, Hitler e Mussolini. La solitudine di un Papa: Torino, 2007, p. 176: in La Civilt à Cattolica, 5 de julho de 2008, p. 17; L'Osservatore Romano, n. 169, 23 de Julho de 1938, p. 1; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008).
Em 28/07/1938, Pio XI dirigiu-se aos estudantes da Propaganda Fide: "Esqueceu-se que a raça humana, toda a raça humana, é uma raça humana única, grande e universal. A expressão raça humana denota, precisamente, a raça humana … No entanto, não se pode negar que neste universo universal raça, não há espaço para raças especiais ou para uma infinidade de variações diferentes ou mesmo para muitas nacionalidades que são ainda mais especializadas. … Poderíamos muito bem perguntar por que a Itália precisou imitar a Alemanha. … Devemos chamar as coisas por seu nome se não quisermos incorrer em graves perigos, incluindo o risco de perder o nome e até a noção das coisas." (L'Osservatore Romano, n. 176, 30 de julho de 1938; DUCE, Alessandro. La Santa Sede e la question ebraica, 1993-1945: Roma, 2007). Sobre essa intervenção, Mussolini, então em Forlì, mostra-se muito irritado com este 'golpe' ao Ministro Ciano, que por sua vez relatou o fato a Borgongini-Duca, em termos desrespeitosos com o Papa (ASV, Arch. Num. Italia, b. 9, fasc. 5, ff. 81-96; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008).
Do outro lado, associações judaicas como a Alliance Israélite universelle agradeceram ao Papa Pio XI pelo seu discurso corajoso nos seguintes termos: "Hoje falou Roma, isto é, a mais alta autoridade moral que existe no mundo civilizado. oferecer-lhe a sua homenagem, com a sua esperança, por tão elevada linguagem." (ASV, AES, Italia , Pos. 1054 PO, fasc. 730, f. 46).
Após o discurso de julho, o Papa mandou preparar um longo artigo artigo para o L'Osservatore Romano dissertando sobre seu discurso. O Papa, entretanto, decidiu não publicá-lo diretamente do Vaticano e o enviou para o estrangeiro, onde foi publicado pelo Jornal Suíço La Libert de 06/08/1938 (ASV, AES, Italia , Pos. 1054, PO fasc. 729, ff. 8- 13; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008).
Em 12/08/1938, o L'Osservatore Romano deu cobertura de primeira página a um artigo intitulado "A citation from Berlin", em que rebatia as interpretações do discurso pelo Jornal alemão National Zeitung e reiterando a mensagem papal contrária ao racismo. Em 20/08/1938, o Card. Pacelli registrou uma Audiência que tivera com o Papa Pio XI: "O Padre Gemelli escreve ao Santo Padre que o Prefeito de Milão [Giuseppe Marzano] convocou o Editor-Chefe das publicações da Universidade do Sagrado Coração e obrigou-o a assinar uma declaração dizendo que não publicaria o Discurso do Santo Padre de 28 de Julho sobre o racismo."
"Infelizmente – isto também foi feito noutros casos, mas estes podem ser representados pelo presente caso quando se percebe o que a Universidade Católica é para o Papa. Portanto, ou o Pe. Gemelli providenciará ou o Papa providenciará, falando e escrevendo como achar melhor. A Igreja merece isso." (ASV, AES, Stati Ecclesiastici, Pos. 430A, fasc. 355, ad diem; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008).
Entre set-out de 1938, a Itália Fascista promulgou e pôs em prática leis raciais (Provvedimento per la difesa della razza nella scuola fascista), replicando a legislação da Alemanha (FATTORINI, Emma. Pio XI, Hitler e Mussolini. La solitudine di un Papa: Torino, 2007, p. 176; La Civilt à Cattolica, 5 de julho de 2008, p. 17; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008).
Em 06/09/1938, o Papa Pio XI recebeu peregrinos da Rádio Católica da Bélgica e falou: "Ouçam com atenção. Abraão é definitivamente o nosso Patriarca, o nosso antepassado. … Antissemitismo é um movimento odioso. Nós, cristãos, não devemos ter nada a ver com isso. … O antissemitismo é inadmissível. Espiritualmente somos todos semitas." (MICCOLI, Giovanni. L'enciclica mancata di Pio XI sul razzismo e l'antisemitismo: in La Civilt à Cattolica, 2-16 de agosto de 2008, p. 309; FATTORINI, Emma. Pio XI, Hitler e Mussolini. La solitudine di un Papa: Torino, 2007, p. 181; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008). Três dias depois, em 09/09/1938, o Card. Pacelli reunia-se em Audiência com o Papa Pio XI e registrava: "Pe. Tacchi Venturi disse a Mussolini que como italiano, o Santo Padre lamenta verdadeiramente ver uma história do bom senso italiano abrir a porta ou a janela a uma onda de antissemitismo alemão. Há um tesouro muito exaltado e muito verdadeiro do qual a Igreja, num Documento sacratíssimo e solene, nos diz: todos nós, no seio de Abraão, e Abraão é o nosso Patriarca, o Patriarca de todos nós. Qui filii sunt promissionis aestimantur in semine (Rm 9,8); Patriarchae nostri Abrahamae (Cânon Missae)." (ASV, AES, Italia, Pos. 1054 P.O., fasc. 727; O'Shea, Paul. Politics and the Jews of Europe: 1917-1943, Kenthurst, 2008).
Em 15/09/1938, o Papa Pio XI disse em Audiência às Irmãs de Nôtre-Dame du Cénacle (com as quais estava associado desde o seu ministério sacerdotal em Milão), que tomou naquele dia conhecimento de "algo muito grave", que estava adquirindo as características de uma "verdadeira apostasia". Possivelmente se referisse ao "Manifesto degli scienziati razzisti" (Manifesto dos Cientistas Racistas), publicado no dia anterior.
Em 16/10/1938, Mons. Tardini registrou que na Audiência com Pio XI, o Papa protestou contra o racismo italiano dizendo que "A Itália e os italianos são um rebanho de ovelhas! Certamente não devemos mostrar gratidão a Mussolini por isso." (ASV, AES, Stati Ecclesiici, Pos. 560 P.O., fasc. 592, Appunti di Tardini, p. 15; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008).
Na Audiência de 19/10/1938 com o Papa Pio XI, Mons. Tardini registrou: "Li um relatório do Núncio [Borgongini-Duca] ao Santo Padre sobre uma objecção do Governo italiano por várias frases anti-racistas pronunciadas num Congresso Eucarístico realizado em Chiari, Brescia. Ao ouvir as frases incriminatórias, Sua Santidade comentou: 'Excelente! Com razão! Alguém tem que dizer estas coisas.'" (ASV, AES, Stati Ecclesiici, Pos. 560 P.O., fasc. 592, Appunti di Tardini, p. 23). No referido Congresso de Chiari, duas frases podem ser destacadas: "Hoje é necessária a robustez física, como a dos touros e dos animais de criação estável, enquanto a nossa educação deve visar a mente." e "Deus certamente punirá os alemães e todos os que os seguem." (conversation of Nuncio Borgongini Duca with Minister Ciano of 6 October 1938, in ASV, Arch. Nunz. Italia, b. 9, fasc. 14, ff. 160-163; SALE, Giovanni. Il "Manifesto della razza" del 1938 ei cattolici: in La Civilt à Cattolica, 5 de julho de 2008; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008).
O mesmo Mons. Tardini: "No dia 20 de outubro verei novamente Sua Excelência, o Arcebispo Borgongini, que assumiu a responsabilidade de preparar dois memorandos para o Governo italiano: um sobre o casamento e outro sobre a questão judaica. que um documento oficial deve ser redigido imediatamente, para que possa ser uma prova duradoura de que a Santa Sé alertou o governo italiano das consequências angustiantes das novas leis." (ASV, AES, Stati Ecclesiastici, Pos. 560 P.O., FASC. 592, Appunti di Tardini, p. 25).
E, ainda: "O Padre Tacchi Venturi repete ao Santo Padre que o Governo pretende penalizar todos aqueles que - contrariamente às suas leis celebram um casamento religioso. Na questão racista, há uma intransigência absoluta por parte do Governo. Destaco aqui que o Ministério da Cultura Popular proibiu todos os jornais, periódicos e revistas de reimprimir artigos contra o racismo publicados no L'Osservatore Romano e de publicar outros artigos por sua própria iniciativa, bem como contra o racismo alemão. O Santo Padre respondeu e disse ao Pe. Tacchi Venturi: "Mas isso é nojento! … Tenho vergonha … Tenho vergonha de ser italiano. E você, Padre, por favor diga a Mussolini! Não como Papa, mas sim como italiano, tenho vergonha de mim mesmo! O povo italiano tornou-se um rebanho de ovelhas estúpidas. Falarei abertamente, não terei medo. Sou impelido pela Concordata, mas ainda mais pela minha consciência. Não terei medo! Prefiro ir pedir esmola. Nem pedirei a Mussolini que defenda o Vaticano … Mesmo que a praça esteja cheia de gente, não terei medo! Aqui tudo se transformou em restolho. Estou verdadeiramente entristecido, como Papa e como italiano." (ASV, AES, Stati Ecclesiastici, Pos. 560 P.O., FASC. 592, Appunti di Tardini, pp. 27-38; FATTORINI, Emma. Pio XI, Hitler e Mussolini. La solitudine di un Papa: Torino, 2007, pp. 183-184; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008).
Em 1938 e em 1939, o Card. Pacelli protestou oficialmente a Bonifacio Pignatti Morano di Custoza (Embaixador da Itália no Santa Sé) contra a lei de casamentos. Em 30/10/1938, o Card. Pacelli registra a Audiência com o Papa Pio XI: "Ao falar, o Padre Tacchi Venturi poderia dizer: se realmente desejais publicar a vossa lei, a Santa Sé e os Bispos serão obrigados a fazer o que o dever do seu ministério lhes exige." (ASV, AES, Italia, Pos. 1063, fasc. 755, f. 127). Nesta Audiência, Pio XI descreveu Mussolini como "descortês e infiel."
Em 26/11/1938, o Card. Arthur Hinsley, Arcebispo de Westminster, escreveu ao Card. Pacelli dizendo: "No dia 9 de dezembro haverá uma reunião pública em Londres para pedir ajuda e assistência a todos os que sofrem perseguições por razões de raça ou religião. E pediu por uma palavra autêntica do Santo Padre declarando o princípio de que em Cristo não há discriminação racial e que a grande família humana deve ser unida na paz através do respeito pela personalidade do indivíduo." (ASV, AES, Stati Ecclesiastici, Pos. 575, P.O. fasc. 606 bis, ff. 3-4; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008)
Em 03/12/1938, o Card. Pacelli teve uma Audiência Privada com o Papa e telegrafou a resposta transcrita de Pio XI, autorizando o Card. Hinsley a falar em seu nome nesse protesto. ASV, AES, Stati Ecclesiastici, Pos. 575, P.O. fasc. 606 bis, ff. 8-9). O mesmo sucedeu ao Arcebispo Giovanni Battista, Nasalli Rocca de Bolonha, Dom Ildefonso Schuster de Milão, Angelo Giuseppe Roncalli (futuro Papa João XXIII, Delegado Apostólico na Turquia), o Bispo Antonio Santis de Trieste, o Cardeal Maurilio Fossati (Arcebispo de Turim), etc. Estas posições não parecem ser devidas a uma mera coincidência de tempo e questão, mas sim a uma directiva dirigida aos Prelados através dos canais normais reservados à diplomacia do Vaticano. (FATTORINI, Emma. Pio XI, Hitler e Mussolini. La solitudine di un Papa: Torino, 2007, p. 203; ASV, Arch. Nunz. Italia., b. 9, fasc. 5, ff. 97-106; L'Osservatore Romano, 20/12/2008; Zenit.org, 20/12/2008).
Escrevia o Berliner Morgenpost em 03 de março de 1939, um dia após a eleição do Papa Pio XII: "A eleição do Cardeal Pacelli não é aceita favoravelmente na Alemanha, uma vez que ele sempre foi hostil ao nacional-socialismo." O próprio nome escolhido (Pio XII) foi interpretado como uma mensagem aos nazistas de que a frontal oposição da Igreja Católica aos nazistas continuava.
Em 01/09/1939 estourava a Segunda Guerra Mundial. Em 20/10/1939, a primeira Encíclica do Papa Pio XII, a Summi Pontificatus, apelando a todas as pessoas de boa-vontade para se oporem a dois erros perniciosos: o racismo e o Estado Totalitário. Em linguagem diplomática, endossou a resistência católica e desaprovou o racismo, o anti-semitismo, o Estado Totalitário, a invasão da Polônia (chamada de "hora da escuridão") e a perseguição à Igreja. O Reichssicherheitshauptamt (Escritório Central de Segurança do Reich) respondeu a Encíclica chamando Pio XII de "porta-voz" dos judeus. À Summi Pontificatus seguiu-se por parte uma denúncia por bispos alemães do assassinato de "inocentes e indefesos", incluindo "pessoas de raça ou descendência estrangeira" (Evans, Richard J. (2008). The Third Reich at War. Penguin).
Como já dito acima, não custa repetir:
Em junho/1942, declarava o Núncio Papal da Romênia, o Arcebispo Andrea Cassulo: "Devo proceder com cautela porque [as minhas acções] poderiam arruinar, em vez de serem úteis, tantas pessoas miseráveis a quem devo frequentemente ouvir e ajudar." (Angelo Martini, S.J., "La Santa Sede e gli ebreidella Romania durante la seconda guerra mondiale" (reprint), Civilta Cattolica, 1951, III (2669), p. 459)
Em Agosto de 1942, uma Carta Papal para ser lida em todas as Igrejas da Polônia foi entregue a Adam Sapieha, Arcebispo de Cracóvia, a Carta continha uma declaração de solidariedade e um repúdio ao nazismo. Mons. Sapieha porém lamentou e recusou-se a obedecer à instrução do Papa: "Pelo amor de Deus, é impossível para mim encaminhar essa Carta aos meus sacerdotes, muito menos posso lê-la em voz alta. Se apenas uma cópia dessa Carta chegar às mãos da SS, todas as nossas cabeças irão rolar." Mons. Sapieha mandou queimar a Carta e respondeu ao Papa Pio XII: "Me atormenta profundamente não poder transmitir a Carta de Vossa Santidade aos nossos fiéis, mas isso serviria de pretexto para novas perseguições."
A Igreja Católica holandesa foi menos cautelosa e pagou um preço alto por isso. Em jul/1942, uma Carta Pastoral inspirada pelo Papa e assinada pelos Bispos holandeses foi lida no púlpito de todas as paróquias holandesa. Ao longo da semana seguinte, os nazistas retaliaram enviando 40.000 judeus para Auschwitz, incluindo os judeus convertidos ao catolicismo: sacerdotes, fiéis leigos e religiosos, como Santa Teresa Benedita da Cruz. O Arcebispo de Utrecht lamentou sua insensatez: "Se eu tivesse permanecido em silêncio e não protestado, todos estes judeus católicos ainda estariam vivos."
Hitler então deixou bastante claro que não deveria ser subestimado ou considerado alguém minimamente equilibrado ou civilizado.
Um ano depois desse episódio lamentável, o Papa Pio XII escrevia, em 02/06/1943, essa advertência aos Sagrado Colégio dos Cardeais, dando a eles o princípio de proceder recomendado: "Cada palavra que dirigimos às autoridades responsáveis e cada uma das nossas declarações públicas deviam ser seriamente pesadas e consideradas no interesse dos próprios perseguidos, para não tornar a sua situação involuntariamente ainda mais difícil e insuportável." (Sir Alec Randall. The Pope, the Jews, and the Nazis" (pamphlet), London, Catholic Truth Society, 1963,p. 18. Também em: Peter White, An Attack on Pope Pius XII, Jubilee, June, 1963)
Portanto, a difamação dos anticatólicos contra o Papa Pio XII é apenas parcialmente verdadeira. O Papa precisava ser discreto, agindo com prudência em uma situação tão complexa para não ampliar ainda mais a mortandade dos inocentes, porém não ficou "em silêncio" como as difamações propagam, muito menos apoiou o nazismo, como já ficou bastante provado. Nos discursos anuais de Natal na Rádio do Vaticano, o Papa condenava regularmente a barbárie nazista. Um Editorial do New York Times de 25 de dezembro de 1941 declarou o seguinte: "A voz de Pio XII é uma voz solitária … [ele] é praticamente o único governante que resta no continente europeu que ousa levantar a voz. [Ele] não deixou dúvidas de que os objetivos nazistas também são inconciliáveis com a sua própria concepção de paz de Cristã."
Na Encíclica Mystici Corporis Christi, em 29/06/1943, Pio XII condenou o assassinato de deficientes. Em 26/09/1943, os bispos alemães publicam uma carta aberta condenando o assassinato de "inocentes e indefesos deficientes mentais, enfermos incuráveis e mortalmente feridos, reféns inocentes e prisioneiros de guerra desarmados e criminosos, pessoas de raça estrangeira ou inferiorizada." Em seu discurso de Natal de 1942, o Papa Pio XII denunciou os assassinatos raciais.
Em diversas ocasiões Hitler ordenou o sequestro de Pio XII e a execução dos membros da Cúria Romana, sendo convencido por seus subordinados a não prosseguir com essas ordens por enquanto. O Papa Pio XII, porém, preparou-se para o pior e assinou uma Carta de Renúncia sub conditione de 24/09/1943, que deveria entrar em vigor imediatamente caso ele fosse aprisionado. Se isso acontecesse, os Cardeais deveriam fugir para países neutros como Portugal e eleger um novo Papa no exílio. Também constava que os guardas suíços não deveriam defendê-lo, pois seriam aniquilados e o Vaticano fulminado.
Em 20/01/1946, o Jornal Alemão Salzburger Nachrichten publicava documentos mostrando que Hitler pretendia ignorar a imunidade reconhecida do Vaticano e matar o Papa Pio XII. Em 01/02/1946, Erwin Lahousen testemunhava no julgamento de Nuremberg detalhando os planos de Hitler nesse sentido.
https://www.ptwf.org/wp-content/uploads/2022/08/DISCOV_118_Loringhoven_Hitler_will_kill_pope_20January1946.pdf
https://www.ptwf.org/wp-content/uploads/2022/08/DISCOV_121_Nuremberg_Testimony_Kill_PPXII.pdf
Nesse mesmo ano, Mussolini seria deposto e preso pelos próprios italianos e o novo governo se rendeu aos Aliados. Hitler invadiu a Itália e reconduziu Mussolini ao poder.
Em 16/10/1943, os nazistas iniciaram uma captura em massa de judeus residentes em Roma. Heinrich Himmler ordenou que a Solução Final deveria ser implantada ali. Assim, os judeus locais deveriam ser deportados para o Reich. O Papa não protestou publicamente, ao invés disso usou a rede clandestina que ele já vinha construindo para dar fuga aos judeus para salvar o máximo que conseguisse. O Papa autorizava a emissão não apenas de documentos de identidade e passaportes falsos, mas também de certidões de batismo forjados.
Pio XII chegou a usar inclusive recursos próprios, da Família Pacelli, nesse projeto. Com a incursão dos nazistas na Itália, porém, o Papa voltou sua atenção a encontrar esconderijos para os judeus em Roma. O Papa ordenou por escrito que os institutos religiosos católicos como mosteiros, conventos, escolas, o próprio Vaticano, a residência papal no Castel Gandolfo e até as Catacumbas de Roma fossem abertas para os judeus que estavam sendo perseguidos. O Papa enviava do Vaticano para esses esconderijos guardas para proteger os locais, além de alimentos, remédios, roupas e outras necessidades para esses refugiados; nisso usando inclusive do patrimônio pessoal de sua família, como já dito.
Em 1944, o Papa escreveu de próprio punho a Mons. Domenico Tardini (então Secretário de Estado do Vaticano): “Os judeus precisam da sua própria pátria."
Dos 7.705 judeus que viviam em Roma em 05/06/1944, o Dia da Libertação pelos Aliados, 6.681 deviam seu resgate diretamente ao Papa Pio XII. No livro Three Popes and The Jews, Pinches Lapide estima o número total de judeus que foram salvos graças às ações clandestinas do Papa, que lançou o peso da Igreja nesse projeto de resgate. "O número final de vidas judaicas em cujo resgate a Igreja Católica foi o instrumento é, portanto, de pelo menos 700.000 almas, mas com toda a probabilidade está muito mais próximo de 860.000." Para se ter uma ideia, isso é um total maior do que a soma de resgate de judeus por todas as outras instituições e organizações de ajuda humanitária, até mesmo judaicas.
Em 1939, quando a Alemanha iniciou seu programa de eutanasia dos "racialmente inaptos", Galen foi a principal voz católica que os nazistas temeram. Seu protesto em 1941 levou ao "movimento de protesto mais forte, mais explícito e mais difundido contra qualquer política desde o início do Terceiro Reich" (Evans, Richard J. (2008). The Third Reich at War. Penguin). The Third Reich at War. Penguin). O Arcebispo Conrad Gröber escreveu ao chefe da Chancelaria do Reich e ofereceu-se para pagar todas as despesas incorridas pelo estado para "cuidar de pessoas destinadas à morte". Em 11 de Agosto de 1940, a Conferência Episcopal Alemã publica mais uma Carta Protesto endereçada à Chancelaria do Reich, condenando a política eugenista da Alemanha. O governo se recusou a interromper o programa por escrito, e o Vaticano declarou em 2 de dezembro que a política era contrária à lei natural e divina: "Não é permitido matar diretamente uma pessoa inocente por causa de defeitos mentais ou físicos".
As prisões de padres e apreensão de propriedades jesuítas pela Gestapo em sua cidade natal, Munster, convenceram Galen de que qualquer cautela era inútil. Ele falou em 6, 13 e 20 de julho de 1941 contra a apreensão de propriedades e expulsões de freiras, monges e religiosos, e criticou o programa de eutanásia. A polícia invadiu o convento de sua irmã e a deteve no porão; ela escapou e Galeno fez seu desafio mais ousado ao governo em um sermão de 3 de agosto, em que condenou o racismo, os maus-tratos aos católicos na Alemanha e a eugenia, a perseguição à Igreja: "O direito à vida, à inviolabilidade e à liberdade é uma parte indispensável de qualquer ordem social moral". Ele acusou formalmente os responsáveis pelos assassinatos em uma carta ao Ministério Público. Devido a sua grande popularidade, seus sermãos foram imeditamente censurados, mas Galen conseguiu os distribuir ilegalmente e que eles fossem lidos nas Igrejas. O Serviço alemão da BBC e a Inglaterra lotou aviões com impressão de trechos do sermão, junto com citações da Encíclica Mit brennender Sorge, e os jogou do alto pelas ruas de países ocupados pela Alemanha. (Evans, Richard J. (2008). The Third Reich at War. Penguin, p. 98)
Alguns padres que distribuíram os sermões foram presos e enviados para campos de concentração, o próprio administrador da Catedral do Bispo von Preysing, Bernhard Lichtenberg, protestou por carta a Leonardo Conti, Reich Health Leader. Ele foi preso e morreu a caminho de Dachau. Porém o próprio Galen não foi preso. Sobre isso Hitler disse: "O fato de eu permanecer calado em público sobre os assuntos da Igreja não é mal interpretado pelas raposas astutas da Igreja Católica, e tenho certeza de que um homem como o bispo von Galen sabe muito bem que depois da guerra eu extrairei retribuição até o último centavo". Martin Bormann queria Galen enforcado, mas Hitler e Goebbels pediram um atraso na retribuição até que a guerra terminasse. Os nazistas nunca se sentiram fortes o suficiente para prender (ou executar) altos funcionários católicos alemães, sua violência brutal ao invés disso recaia sobre os membros mais baixos na hierarquia, como padres, religiosos e leigos, e propriedades da Igreja.
É consenso que os nazistas esforçaram-se para literalmente erradicar a Igreja Católica na Polônia. "A ligação de mil anos da Igreja polonesa com Roma proporcionou alguma proteção. O Reich alemão continha 30 milhões de católicos, que reconheciam a autoridade do papa ... e [cada governante alemão], por mais fortemente contrário a Roma, tinha que levar em isso em conta ... A lealdade da Polônia ao papado deu à sua situação uma dimensão internacional." (Jozef Garlinski; Poland and the Second World War; Macmillan Press, 1985; p 60-61)
Após a Ocupação da Polônia, o Núncio Apostólico Polonês, Fillippo Cortesi, abandonou o corpo diplomático. Em 1942, a American National Catholic Welfare Conference relatou que "enquanto os relatórios do Cardeal Hlond chegavam ao Vaticano, o Papa Pio XII protestou contra as enormidades que eles contaram com vigor implacável". A Conferência Episcopal Alemã tomou nota na Encíclica do Papa em 28 de outubro, relatando que o Papa dirigiu-se ao clero polonês em 30 de setembro de 1939, falando de "uma visão de horror louco e desespero sombrio" e dizendo que esperava que, apesar do trabalho dos "inimigos de Deus", a vida católica sobrevivesse na Polônia. Em um discurso de véspera de Natal ao Colégio dos Cardeais, Pio condenou as atrocidades "mesmo contra não-combatentes, refugiados, idosos, mulheres e crianças, e o desrespeito à dignidade humana, à liberdade e à vida humana" que aconteceram na Polônia guerra como "atos que clamam pela vingança de Deus".
O Vaticano usou sua imprensa e rádio para contar ao mundo em janeiro de 1940 sobre o terror do povo polonês. Em 16 e 17 de novembro de 1940, a Rádio Vaticana disse que a vida religiosa dos católicos na Polônia continuava a ser brutalmente restringida e que pelo menos 400 clérigos haviam sido deportados para a Alemanha nos quatro meses anteriores. Além disso, o Papa usou a diplomacia para ajudar as vítimas da guerra, fez lobby pela paz junto a funcionários do Eixo e compartilhou inteligência com os Aliados.
O Chefe da Conferência dos Bispos Alemães pediu ajuda ao Papa, para responder a tentativa de Arthur Greiser de erradicar a Igreja Católica na Polônia, mas o Papa Pio XII ofereceu uma resposta cautelosa. Essa "postura contida e racional", escreveu Garlinski, embora justificada a longo prazo, "não combinava com os poloneses", que esperavam uma linguagem mais direta contra os nazistas. "O Papa estava perfeitamente consciente de que a expansão de Hitler colocou 150 milhões de católicos sob o controle do Terceiro Reich e que as condições para os católicos fora da Polônia poderiam ser afetadas seriamente por seus pronunciamentos." (Jozef Garlinski; Poland and the Second World War; Macmillan Press, 1985; pp.74)
Enquanto isso, a SS designava o campo de concentração de Dachau, com seu próprio bloco de padres (Pfarrerblock), como o local de internação central para clérigos cristãos, que frequentemente eram severamente torturados. Por exemplo, na véspera de Natal de 1938, o prelado austríaco desmaiou sob a árvore de Natal montada na praça da chamada. Em uma Quinta-feira Santa, os guardas da SS açoitaram o capelão austríaco Andreas Rieser no torso nu até o sangue espirrar e depois o feriram com uma coroa de espinhos feita de arame farpado. Na Sexta-feira Santa de 1940, sessenta padres foram crucificados, pendurados em uma estaca por uma hora. Um total de 706 padres eram combatentes da resistência austríaca na prisão nazista, 128 em campos de concentração e 20 a 90 foram executados ou assassinados em campos de concentração. (Erika Weinzierl: Kirchlicher Widerstand gegen den Nationalsozialismus. In: Themen der Zeitgeschichte und der Gegenwart, p. 76, 2004; Jean Bernhard: Pfarrerblock 25487. Dachau 1941-42. 2004, pág. 44; Walter Ferber: 55 Monate Dachau: Ein Tatsachenbericht. 1993, pág. 20 e Sadistische Passionspiele. In: Süddeutsche Zeitung; 1 de abril de 2015)
Quando os bispos holandeses protestaram contra a deportação de judeus durante a guerra, os nazistas responderam aumentando a deportação de judeus e católicos convertidos. "A brutalidade da retaliação causou uma enorme impressão em Pio XII." (Vidmar, John (2005). The Catholic Church Through the Ages. Paulist Press, p. 331).
Quando os judeus saíram dos esconderijos e contaram ao mundo o seu resgate pelo Vaticano, no forneceram relatos contemporâneos bem diferentes da legenda negra que amaldiçoados usam para manchar a reputação e o legado de Pio XII.
O jornal semanal The Jewish News publicava já em 07/07/1944 uma homenagem ao Papa Pio XII: "Refugee, Now in Jerusalem, Tells of Visit at Vatican (Refugiado, agora em Jerusalém, conta sobre Sua Visita ao Vaticano)". O Rabino-Chefe de Roma, Israel Zolli, escreveu uma autobiogria (Before The Dawn) para registrar suas memórias, como líder da comunidade judaica durante a ocupação nazista. Neste livro, ele relata as ações heróicas do Papa e da Cúria Romana sob seu comando. Após a guerra, ele e sua esposa se converteram ao Catolicismo e adotaram o nome de Eugenio e Eugenia, em homenagem ao Papa Pio XII. Diz ele: "Nenhum herói na história comandou um exército de tal maneira … Nenhum foi mais combativo, mais combatido. Nenhum foi mais heróico do que o conduzido por Pio XII em nome da caridade cristã." Quando Pio XII morreu, em 1958, a Ministra dos Negócios Estrangeiros de Israel (e futura Primeira-Ministra), Golda Meir, escreveu a seguinte homenagem: "Compartilhamos a dor do mundo pela morte de Sua Santidade Pio XII ... Durante os dez anos de terror nazista, quando o terrível martírio atingiu o nosso povo na década do terror nazista, a voz do Papa ergueu-se em favor das vítimas." Já Albert Einstein, o judeu mais famoso do séc. XX que escapou por pouco do Nazismo, declarou em Entrevista à Revista Time, em 23/12/1940: "Sendo um amante da liberdade, quando a revolução nazista chegou à Alemanha, procurei as Universidades para defendê-la, mas as Universidades foram imediatamente silenciadas. Então olhei para os grandes editores dos jornais, mas eles, assim como as universidades, foram silenciados em poucas semanas. Então olhei para escritores individuais ... eles também estavam mudos. Apenas a Igreja atravessou claramente o caminho da campanha de Hitler para suprimir a verdade. Até então, nunca tive nenhum interesse especial pela Igreja, mas hoje sinto por ela uma grande afeição e admiração, a única que teve coragem de lutar pela verdade espiritual e pela liberdade moral. Sou forçado a isso confessar que aquilo que antes desprezava, agora elogio sem reservas."
Em 03/08/1946, o Papa Pio XII recebeu uma delegação árabe em Audiência, que veio a Roma para dissuadi-lo de apoiar uma pátria judaica na Palestina. Pio XII concluiu a reunião deixando a delegação decepcionada, pois se recusou a atender o requerimento e finalizou a audiência falando e falando: "Depois de ter recebido nestes últimos dias numerosos apelos e reclamações das diversas partes do mundo e por diferentes motivos, pensamos que seja supérfluo dizer-vos que reprovamos qualquer recurso à força e à violência, de onde quer que provenha, como também condenamos várias vezes no passado as perseguições de um antissemitismo fanático, desencadeado contra o povo judeu. Mantivemos sempre esta atitude de absoluta imparcialidade nas circunstâncias mais diversas, e com ela pretendemos conformar-nos no futuro. Mas é evidente que esta imparcialidade que nos é imposta pelo nosso Ministério Apostólico e nos coloca acima dos conflitos que agitam a sociedade humana não pode significar indiferença, sobretudo neste momento tão difícil. E assim vos garantimos que tudo quanto depende de nós e das possibilidades que nos serão oferecidas, empenhá-lo-emos para que a justiça e a paz se tornem uma realidade benéfica, e criem com a cooperação eficaz de todos os interessados, uma ordem que garanta a cada uma das partes actualmente em conflito, a segurança da existência e, ao mesmo tempo, condições físicas e morais da vida, sobre as quais se possa ao mesmo tempo estabelecer normalmente um estado de bem-estar material e cultural."
https://www.ptwf.org/wp-content/uploads/2022/08/DISCOV_106_Arabs_Call_on_Pope_Aug_4_1946.pdf
https://www.ptwf.org/wp-content/uploads/2022/08/DISCOV_150_Translation_Speech_to_Arabs.pdf
De acordo com uma pesquisa realizada pela Fundação Raoul Wallenberg, foi Pio XII quem "abriu o caminho" para que os países católicos membros das Nações Unidas votassem positivamente a favor de uma divisão da Palestina em novembro de 1947. Por exemplo, artigos de jornais compilados pelo Pave the Way Foundation mostram que o Vaticano encorajou a Espanha reconhecer o estado judeu em 1955. O diretor da Pave the Way Foundation, Elliot Hershberg, disse: "nossa pesquisa mostrou que o relacionamento positivo do Papa Pio XII com o povo judeu começou em sua juventude por Pacelli."
Esse prestígio da Igreja e do Papa Pio XII começou a mudar na década de 60, quando o alemão Rolf Hochhuth publicou uma obra chamada O Vigário (Der Stellvertreter), uma peça teatral de ficção dramática que lançava conjecturas maldosas sobre a atuação do Papa Pio XII durante a II Guerra. Mons. Vicente Cárcel Ortí, entretanto, demonstra em "Pío XII (1939-1958): El Papa, Defensor Y Salvador De Los Judios" como Hochhuth "foi financiado pelos serviços secretos da antiga União Soviética (URSS), que lançaram uma campanha difamatória contra a Igreja Católica nos anos mais duros da Guerra Fria". Da peça, então, a mídia mundial e a inteligentizia liberal, ateia, protestante e socialista ligaram as bobinas anticatólicas consolidando a leyenda negra sobre o Papa. Isso a tal ponto que converteu a propaganda difamatória numa verdade social, que a historiografia moderna tem desbancado.